HQs: Temas Históricos #01 - A Guerra nas Hqs

 "A suprema arte da guerra é derrotar o inimigo sem lutar" (Sun Tzu)

      Em tempos de guerra é comum presenciarmos algum grau de mudança na produção cultural. Nos países envolvidos diretamente no conflito essas mudanças mostram-se mais bruscas e a arte, para o bem ou para o mal, acaba sendo influenciada e até mesmo usada como instrumento de guerra. Com os quadrinhos, uma mídia tradicionalmente mais acessível e flexível às mudanças, a guerra sempre encontrou um terreno fértil para a propaganda político-ideológica.
    Neste artigo, mostraremos primeiramente um pouco das hqs de ficção que foram produzidas durante os diferentes conflitos do século XX e inspiradas por eles. Depois, as hqs de não-ficção (jornalísticas e biográficas).




 A Segunda Guerra Mundial 

      A Segunda Guerra Mundial foi o laboratório onde os governos envolvidos no conflito usaram e abusaram do poder das mídias da época para divulgar e incutir no povo os ideais que eles julgavam necessários ao esforço de guerra. Os quadrinhos, que atingiam principalmente uma população jovem, serviram perfeitamente a este propósito. No caso da Primeira Guerra Mundial, apesar dela ter ocorrido durante a Era de Platina dos quadrinhos (1897-1937), as hqs ainda tentavam achar seu espaço nessa época, saindo das tiras de jornal e conquistando as revistas. Não havia ainda espaço ou interesse em explorar o conflito nessa nova mídia. Já a Era de Ouro dos quadrinhos (1938-1955), marcada pelo surgimento dos super-heróis, coincidiu com a época da Segunda Grande Guerra.

      O Super-Homem, criado em 1938, teve seu uniforme modelado com cores mais próximas à bandeira americana, destacando-se em seu papel de símbolo patriótico. O único problema é que ele não era um americano legítimo, e sim um alienígena "naturalizado". Porém, em 1941, surgiu o herói que se tornaria a personificação do ideal americano de coragem e patriotismo: o Capitão América.

      Criado por Joe Simon e Jack Kirby, o Capitão América estreou em 1941 (alguns meses antes dos Estados Unidos entrar oficialmente no conflito). Foi o único super-herói, até então, a ganhar um título próprio antes de aparecer em qualquer outra hq. Este sim, um cidadão americano comum, pequeno e fraco até, mas de grande coragem e muito motivado para entrar na guerra, tornando-se, com a ajuda da ciência, um super soldado.
      Curiosamente, na época em que surgiu o Capitão América, a maioria dos americanos não era favorável à entrada do país no conflito, defendendo uma posição de neutralidade (posição essa que só mudaria após o fatídico ataque à base de Pearl Harbor em dezembro de 1941) apesar do governo americano já estar apoiando financeiramente o exército inglês há algum tempo. Mas uma grande parte dos roteiristas e desenhistas na época eram judeus ou descendente de judeus e usaram as hqs para fazer propaganda contra os nazistas, seus algozes. Nessa época, as capas mostrando Hitler, Mussolini e Tojo (primeiro ministro do Japão) sendo surrados ou ridicularizados pelos heróis eram bem comuns.
      Além do Capitão América, outros super-heróis da Marvel como Namor e Tocha Humana (1939) também participaram ativamente do conflito. Décadas mais tarde, esses heróis que lutaram lado a lado seriam reunidos numa equipe chamada os Invasores (1969). Batman, Sentinelas da Liberdade, Sociedade da Justiça, Capitão Marvel, Namor, Tarzan, Mandrake, Fantasma e Flash Gordon, entre outros, também lutaram na Segunda Grande Guerra combatendo nazistas e japoneses.

      Em 1942 surge a Mulher-Maravilha. Assim como Super-Homem e Capitão América, seu uniforme era praticamente uma bandeira americana, apesar de sua origem mítica e estrangeira. Num momento em que grande parte dos homens estava no front, longe de casa, a Mulher-Maravilha veio para mostrar a todas as mulheres que elas podiam sim ser fortes e cuidar sozinhas de si mesmas.

      Nem só de super-heróis servia-se a propaganda de guerra. Walt Disney e seus personagens também foram convocados para o front. As histórias, apesar do lado cômico, exploravam o cenário de dificuldades econômicas criado pela guerra. A figura de Mickey Mouse foi amplamente utilizada, até mesmo em cartazes de guerra. Um dos códigos usados pelos americanos durante o desembarque na Normandia no Dia D foi "Mickey Mouse". Zé Carioca, no Brasil, e Panchito, no México, foram personagens criados nessa época, frutos da política de "boa vizinhança" dos Estados Unidos com potenciais aliados.
       Curiosidade: em 1942 Walt Disney criou o polêmico curta de animação A Face do Fuehrer, que mostra o Pato Donald como um cidadão alemão que se torna um soldado obcecado devido à lavagem cerebral do regime nazista. Apesar de ser antinazista, o desenho acabou sendo, mais tarde, banido da TV devido caracterizações consideradas racistas para os dias de hoje.

      E, falando em racismo, é interessante notar que nem só os países do Eixo manifestavam abertamente essa visão distorcida sobre outras raças. Os gibis americanos retratavam os aliados como seres humanos quase perfeitos e abusavam dos estereótipos e clichês ao desenhar os inimigos. Os soldados alemães eram homenzinhos atarracados, com feições pesadas e quase simiescas. Cientistas germânicos eram algumas vezes retratados com aparência reptiliana, dentes afiados e uma palidez cadavérica. Já os japoneses eram mostrados como baixinhos, dentuços e idiotas usando óculos de “fundo-de-garrafa”. Suas peles eram exageradamente amarelas, cor associada à covardia.
   
      
      Praticamente todos os gibis da época engajaram-se em menor ou maior grau com a guerra. A propaganda teve tanta força que incomodou sensivelmente os países do Eixo. Hitler, que já havia banido os gibis do Príncipe Valente das cidades que conquistara, instruiu o ministro da propaganda nazista Joseph Goebbels a preparar um discurso contundente contra os personagens de Walt Disney. Na Itália, Benito Mussolini baniu os gibis norte-americanos do seu território. Sem dúvida, um exemplo inegável da força exercida pela nona arte nesta época.
      Com o fim da guerra em 1945, a temática bélica começou a perder um pouco de sua força nas hqs. As histórias de guerra começaram gradualmente a ceder espaço às histórias de ficção científica, tema que começou a fazer sucesso no final da década de 40, marcando também o fim da Era de Ouro dos Quadrinhos. Porém, uma verdade quase imutável a qual a humanidade já se acostumara é que sempre há uma guerra acontecendo em algum lugar e essa temática não desapareceria tão facilmente das hqs.
      Muitos títulos sobre a Segunda Grande Guerra ainda surgiriam após o término do conflito. Cito aqui dois deles.   
       
      Em 1963 o mundo já vivia no clima da Guerra Fria e a maioria das hqs de guerra tinham foco neste conflito. Na contramão da época, a Marvel lançou Sargento Fury e o Comando Selvagem, uma hq ainda ambientada no cenário da Segunda Grande Guerra.
      Nick Fury era um sargento linha dura, sempre com um charuto na boca e barba por fazer. Tinha sempre um xingamento na ponta da língua para os seus subordinados, mas morreria por eles se fosse preciso. Chamava a atenção nesse grupo a sua formação multiétnica, algo incomum e ousado para a época.
      Mais tarde, já no contexto da Guerra Fria, Nick Fury passaria a chefiar a S.H.I.E.L.D (Supreme Headquarters of International Espionage and Law-Enforcement Division).

      Outra obra interessante, lançada lá em 1983, traria uma história inusitada sob o ponto de vista de um japonês:

     
Adolf Ni Tsugu foi publicado pela primeira vez entre janeiro/1983 e maio/1985 na revista japonesa Shukan Bunshun, sendo depois lançado em encadernados pela Editora Kodansha em 1996. No Brasil foi publicado pela Conrad (Adolf, 2006) e pela Pipoca & Nanquim (Recado a Adolf, 2020).
       Do mestre Osamu Tezuka, o mangá conta a história de três homens de mesmo nome durante a Segunda Guerra Mundial: Adolf Kamil (um filho de judeus), Adolf Kauffmann (filho de um nazista com uma japonesa), e Adolf Hitler. Três pessoas cujos destinos estão entrelaçados com o de um repórter japonês chamado Souhei Touge, dono de um documento que guarda um segredo sobre Hitler. Um segredo que, ao ser revelado, destruirá Adolf Hitler e o regime nazista.


 A Guerra Fria: Uma guerra que gerou outras 

      Após a Segunda Guerra Mundial o mundo viu-se polarizado: de um lado a União Soviética comandando o bloco comunista e do outro os Estados Unidos comandando o bloco capitalista. Na visão dos americanos eles eram o bem (heróis) e os soviéticos eram o mal (vilões). Um novo pano de fundo surgia para as hqs de guerra.
      Estávamos na Era de Prata dos Quadrinhos, onde os super-heróis haviam perdido bastante de sua popularidade. Então, uma característica das hqs de guerra nesta época era a presença de personagens que eram soldados normais, sem super poderes. Em suma, americanos comuns, mas cheios de coragem. Com o início da Guerra da Coréia, esse tipo de hq ganhou evidência.

      A Guerra da Coréia (1950-1953), um dos subprodutos da Guerra Fria, foi um conflito iniciado quando a Coréia do Norte (apoiada pela China e União Soviética) invadiu a Coréia do Sul (apoiada pelos Estados Unidos). Na prática, é uma guerra que ainda está acontecendo pois nunca foi declarado um vencedor, apenas um cessar-fogo de comum acordo que já dura 69 anos. Da mesma forma que durante a Segunda Guerra, as hqs retratavam os soldados americanos como indivíduos perfeitos e ridicularizavam os inimigos, abusando dos clichês. Aliás, não havia praticamente diferença entre coreanos, chineses, vietnamitas, japoneses... todos os asiáticos eram desenhados da mesma forma pejorativa e elementos culturais eram misturados sem nenhum pudor (não era incomum ver um soldado coreano gritar "banzai", por exemplo).

      Outra conflito originado diretamente pela Guerra Fria foi a Guerra do Vietnã (1955-1975). Oficialmente, foi uma guerra travada entre o Vietnã do Norte e o Vietnã do Sul. Porém, assim como na Guerra da Coréia, O Vietnã do Norte era apoiado por China e União Soviética e o Vietnã do Sul era apoiado principalmente pelos Estados Unidos.

      Foi nesta época, mais precisamente durante a década de 60, que a Marvel criou alguns de seus super-heróis mais icônicos, cujas origens estavam diretamente ligadas ao contexto da Guerra Fria.
      O Quarteto Fantástico surge em novembro de1961 no contexto da Corrida Espacial entre USA e URSS, outro desdobramento da Guerra Fria. Em abril daquele ano o astronauta soviético Yuri Gagarin tornou-se o primeiro ser humano a alcançar o espaço, mexendo e muito com os brios do governo americano. Na primeira história do grupo o texto menciona que eles estão no meio de uma "corrida espacial" com uma "potência estrangeira", ou seja, a alusão não poderia ser mais clara. O grupo embarca num foguete espacial projetado pelo cientista Reed Richards e, durante a viagem, são atingidos por uma tempestade de raios cósmicos que modifica seu corpos, conferindo-lhes super poderes.
      Outra referência óbvia: o principal inimigo do grupo, o super vilão Dr. Destino, é o ditador de um pequeno país do leste europeu, região de influência do bloco comunista.

      Outro aspecto (assustador) da Guerra Fria foi a corrida armamentista, mais especificamente a "corrida nuclear". Muitos historiadores acreditam que o momento da detonação da bomba atômica de Hiroshima foi o momento exato em que a Guerra Fria teve início. O recado aos soviéticos e ao resto do mundo havia sido claro: quem tinha a bomba atômica, tinha poder.
      O Incrível Hulk, criado em 1962, nada mais é do que um produto da corrida nuclear.

      O cientista Bruce Banner, um brilhante físico nuclear, desenvolve a "Bomba Gama". Durante o teste do artefato, ele salva um jovem que inadvertidamente entrou no campo de testes e é atingido pela radiação gama liberada pela bomba. A radiação provoca modificações em seu corpo, liberadas pelo stress ou mudanças bruscas de humor, transformando-o numa criatura verde gigantesca e superpoderosa. 
Não é preciso muito esforço para entender a analogia. Basta trocar a expressão "bomba gama" por "bomba atômica".
      Outros personagens claramente inspirados pela corrida nuclear foram os X-Men.

      A palavra "mutante" foi largamente utilizada por cientistas da época para se referir aos sobreviventes das bombas de Hiroshima e Nagasaki. Além disso, os X-Men são um grupo perseguido por serem diferentes, uma clara referência ao racismo e à cultura de segregação racial, algo ainda muito presente nos Estados Unidos na época. Esse racismo sempre foi um dos principais objetos de crítica dos soviéticos aos americanos.      
      Voltando à Guerra do Vietnã, os editores tratavam desse conflito com uma certa cautela. Isso porque, quanto mais a guerra se arrastava, mais polêmica ela provocava e a opinião pública americana começou a ficar dividida quanto à validade da participação americana no conflito. Porém, a Marvel ousou e usou o cenário de guerra para dar origem a um dos mais icônicos heróis das hqs: O Homem de Ferro.
       
     
Durante a Guerra do Vietnã, o gênio e milionário Tony Stark é atingido por uma granada. Ele sobrevive, mas com estilhaços do explosivo perigosamente próximos ao seu coração. Capturado pelo terrorista Wong Chu e seu bando, ele é forçado a construir uma arma. Porém, com a ajuda de outro prisioneiro, o professor Ho Yinsen, ele engana Wong Chu e, ao invés da arma, ele constrói um dispositivo que o manteria vivo juntamente com uma poderosa armadura de combate que o permitiria subjugar seus captores. Desde então, passou a desenvolver novas e aperfeiçoadas versões da armadura e tornou-se o Homem de Ferro.
       Além disso, Tony Stark tornou-se um personagem essencial aos americanos na Guerra Fria fornecendo armas e tecnologia às Forças Armadas.

      A Guerra do Vietnã terminaria em 1975 com uma derrota humilhante para os Estados Unidos, mas a Guerra Fria ainda continuaria até 1991.
      Em 1986, quando o regime comunista já dava mostras de desgaste na URSS, duas obras relacionadas à Guerra Fria e de suma importância para a história das hqs foram publicadas pela DC Comics.

      Em O Cavaleiro das Trevas, obra máxima de Frank Miller, a história mostra uma tensão crescente entre Estados Unidos e URSS, com a ameaça de um conflito nuclear tornando-se uma paranóia constante na mente dos americanos. O conflito entre Batman (contra o governo) e Superman (a favor do governo) torna-se uma verdadeira paródia de Socialismo x Capitalismo.
    Watchmen, de Alan Moore e Dave Gibbons, mostra uma América a um passo de elevar a Guerra Fria a um outro patamar, partindo para o confronto franco com os soviéticos. Neste contexto, um grupo de heróis aposentados vê-se envolvido num plano maquiavélico engendrado por Ozymandias, um dos antigos membros do grupo e também o ser humano mais inteligente do planeta, para acabar de vez com a Guerra Fria, mas ao custo de milhares de vidas. Similar às origens do Hulk, Dr. Manhattan é o único personagem do grupo com super poderes, adquiridos também através de um acidente nuclear. Mas as similaridades param por aí: Dr. Manhattan é uma criatura com os poderes de um deus.
      Além das obras aqui citadas, quase todas as hqs de super-heróis da década de 80 tiveram alguma influência da Guerra Fria, pois uma geração inteira nasceu e cresceu dentro do conflito.
      Uma hq produzida após a Guerra Fria e que merece destaque foi uma versão alternativa das origens do Super Homem:

      Lançada originalmente em 2003, essa hq reinventa a origem do Superman partindo da sua chegada ao Planeta Terra: ao invés da nave que trazia o pequeno Kal-El cair no Kansas, ela cai numa fazenda coletiva na União Soviética. O Superman cresce sob o regime comunista e torna-se, então, uma força poderosíssima à serviço da URSS.
    Foi publicada no Brasil pela Panini em forma de minissérie em 2004, encadernado em 2006 e em edição de luxo em 2017. 

 
 A Guerra Real: Hqs jornalísticas e biográficas 

      O século XX, infelizmente, foi muito rico em conflitos armados. Alguns atravessando gerações, até os dias de hoje. A guerra nas hqs muitas vezes abandona o campo da ficção e nos traz relatos jornalísticos e até mesmo autobiográficos daqueles que viveram na pele os horrores de uma guerra. São muitas obras nesse sentido. Citarei aqui aquelas que li e recomendo. 

      Há pouca obras em português sobre a Primeira Grande Guerra. Era A Guerra de Trincheiras compensa essa carência por ser uma obra primorosa.
      Diferente de conflitos posteriores, a Primeira Guerra Mundial aconteceu numa época onde a tecnologia bélica ainda não era tão desenvolvida para permitir o combate à maior distância. As lutas eram praticamente cara a cara e viscerais. A hq mostra de forma realista e contundente os horrores dos campos de batalha, as condições desumanas a que os soldados eram submetidos e as consequências de um conflito sangrento que ceifou a vida de 9 milhões de militares e 10 milhões de civis.


      Num episódio pouco conhecido, os Estados Unidos aprisionaram 120 mil nipo-americanos em campos de concentração durante a Segunda Guerra. Nesta obra autobiográfica, o ator e ativista norte-americano George Takei (o Oficial Hikaru Sulu de Jornada nas Estrelas), detido num desses campos juntamente com sua família, narra essa experiência assustadora de sua infância. Eles nos Chamavam de Inimigo é uma história impressionante sobre coragem, lealdade e amor.


      Primeira hq a ganhar um Prêmio Pulitzer, Maus conta a história de Vladek Spiegelman, judeu polonês que sobreviveu ao campo de concentração de Auschwitz, narrada por ele próprio ao filho Art Spiegelman. Apesar das representações caricatas (os judeus são desenhados como ratos, os nazistas como gatos, poloneses não-judeus são porcos e americanos são cachorros) é uma obra poderosa que evidencia todo o horror do holocausto e o sofrimento dos sobreviventes que não acabou após a guerra. Na minha opinião, a melhor hq sobre o tema já produzida.

      Gen Pés Descalços (Hadashi no Gen, no original japonês) foi publicado originalmente em formato de série entre 1972 e 1973 na revista japonesa Shonen Jump. No Brasil, foi publicado pela Conrad, primeiro em 1999 (em quatro volumes e no sentido ocidental de leitura), e, depois, em 2011 (em dez volumes e no sentido original japonês de leitura). É um relato autobiográfico do autor Keiji Nakazawa que tinha 7 anos quando a bomba atômica atingiu Hiroshima, cidade onde morava com a família.
      A história conta a vida de uma família japonesa, vítima da bomba atômica, durante e após a Segunda Guerra Mundial. Assim como em Maus, onde os sobreviventes do Holocausto tiveram que enfrentar ainda mais sofrimento no pós-guerra, Gen revela a dura e cruel realidade enfrentada pelos sobreviventes da bomba. É quase impossível não sentir a angústia dos personagens em alguns momentos.

      Outro mangá que trata da Segunda Guerra sob o ponto de vista dos japoneses, Zero Eterno (Eien no Zero, no original) é uma obra que, infelizmente, acabou passando meio despercebida aqui no Brasil. Originalmente um livro publicado em 2006 pelo escritor Naoki Hyakuta, tornou-se um verdadeiro fenômeno de vendas no Japão ganhando uma adaptação para o cinema feita em 2013, uma série de TV lançada em 2015 e o mangá escrito por Souichi Sumoto.
  Kentaro Saeki, um jovem desempregado e sem perspectivas, começa a mudar sua vida no dia em que sua irmã o convence a juntar-se a ela numa missão: descobrir quem foi seu avô Kyuzo Miyabe, um piloto de caça que morreu em missão pelo Tokkotai, a esquadra de pilotos suicidas japoneses da Segunda Guerra Mundial.
      Publicado no Brasil pela JBC em cinco volumes, é uma obra essencial para entender o espírito dos japoneses durante a guerra. O capítulo final é algo memorável, impossível de não se emocionar.
      

      Quando Fidel Castro toma a cidade de Havana no despertar do ano de 1959, Sonya – então com 17 anos – acredita nas promessas da Revolução Cubana. Estudante de medicina que sonha em virar pintora, ela junta-se à milícia e acaba presa entre o idealismo e a ideologia. Como voluntária na Baía dos Porcos, ela se choca ao encontrar um antigo amor do outro lado do campo de batalha, e mais ainda quando é presa e torturada pelos seus próprios camaradas. Com cicatrizes físicas e emocionais, Sonya tenta encontrar satisfação na arte. Mas, quando se dá conta de que nenhuma de suas iniciativas – seja com uma arma ou um pincel na mão – se enquadra no novo regime, ela precisa fazer escolhas entre sua família, seu amor e seu amado país. Ilustrada pelo artista indicado ao prêmio Eisner Dean Haspiel (The Alcoholic), Cuba: Minha Revolução é uma história baseada em fatos reais.


      Marco na história das narrativas gráficas, Palestina, de Joe Sacco, é o livro que redefiniu as bases do gênero “jornalismo em quadrinhos”. Publicado originalmente em nove gibis, entre 1993 e 1995, a HQ ganhou uma edição completa em 1996, e ganhou alguns dos mais importantes prêmios tanto dos quadrinhos quanto do mundo literário, como o American Book Award. É já um clássico e está entre as principais histórias em quadrinhos dos últimos 50 anos. O livro é fruto de uma extensa pesquisa e mais de 100 entrevistas com palestinos e judeus, realizadas no início dos anos 1990, durante diversas visitas à região da Faixa de Gaza e Cisjordânia. Com uma narrativa dinâmica e um talento para reproduzir os diálogos, Sacco apresenta um testemunho humano comovente, mas também um panorama histórico do conflito que continua fazendo inúmeras vítimas.

       A Guerra da Bósnia foi um conflito armado que aconteceu entre 1992 e 1995 na região da Bósnia e Herzegovina. É considerado um dos conflitos mais complexos do Século XX.
      Em 1992, começa o cerco a Sarajevo, que resultou na morte de mais de 12 mil bósnios. Após terem a casa bombardeada, o editor de quadrinhos e fundador da editora SAF, Ervin Rustemagic, sua mulher e filhos, buscam refúgio em um abrigo e, através de um aparelho de fax, começa a se comunicar com seus amigos, dentre eles, Joe Kubert, que decide registrar em quadrinhos os dois anos e meio dessa família na cidade sitiada. Fax de Sarajevo foi publicado originalmente em 1996 nos Estados Unidos pela Dark Horse.


     Publicada no Brasil pela Panini, primeiro em 2008 e, depois, em 2018 numa versão de Luxo, Os Leões de Bagdá é uma fábula sobre a Guerra do Iraque baseada em fatos reais.
      Na primavera de 2003, um bando de leões escapou do Zoológico de Bagdá durante um bombardeio norte-americano. Perdidos, confusos, famintos e finalmente livres, os quatro leões perambularam pelas ruas destruídas de Bagdá numa batalha desesperada pela sobrevivência. Inspirando-se numa história real, Brian K. Vaughan e Niko Henrichon criaram um ponto de vista único sobre a vida durante a Guerra do Iraque, lançando luz sobre esse conflito como apenas uma graphic novel é capaz de fazer. Retratando o drama dos animais, Os Leões De Bagdá levanta algumas questões sobre o verdadeiro significado da liberdade – ela pode ser dada ou apenas conquistada por meio de luta e sacrifício?


      A guerra talvez seja a mais desprezível forma de expressão da fraqueza do espírito humano. Infelizmente, creio que a humanidade ainda deverá evoluir muito para se livrar dela. Até lá, a nona arte, bem como todas as formas de arte, será essencial para lembrar ao mundo o quanto a guerra, seja qual for e onde for, é inútil e cruel.

Paz: hoje e sempre!

Por Cesar Alves

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